"É fato que entre a época das minhas avós e a minha,
representações e comportamentos do "feminino" passaram e passam por
notáveis transformações. Haja vista que hoje temos uma presidenta da
República. O chefe do país é uma chefa.
No entanto algo continua igualzinho ao tempo das
minhas avós. Ainda se espera que a mulher seja boa em tudo o que faz.
Isto é: ela deve ser boa filha, boa aluna, boa mãe, boa companheira, boa
ex-companheira, boa gerente, boa subordinada.
Espera-se que uma mulher não seja só uma médica, ela
tem que ser uma ótima médica. Não é suficiente ser aluna do curso de
engenharia, ela tem que ser uma excelente aluna. Nas alturas então,
pouco importa que ela seja uma entre quinhentos pilotos, terá que ser
uma super pilota.
Motorista de busão? Igual. Sabe por que ela foi
contratada? Porque foi de longe a melhor nos testes. Até mesmo no mundo
da fantasia infantil, as mulheres precisam ser princesas lindas e
perfeitas, ou então serviçais muito boazinhas. Caso contrário elas são
bruxas. Cheias de verrugas no rosto e pelos nas ventas.
Já o bruxo masculino se confunde com o mago ou
sábio. Por exemplo, muita gente chama o estupendo escritor Machado de
Assis (1839-1908) de o bruxo. Bruxo, nesse caso, significa o grandioso, o
mágico das palavras.
Mas vai alguém chamar a também estupenda escritora
Clarice Lispector (1920-1977) de a bruxa. Só se for para
desclassificá-la. Deve ser por conta disso que muitas mulheres - que não
eram boas filhas, nem boas mães, nem boas esposas - foram denominadas
bruxas, e queimadas vivas nas fogueiras da Idade Média.
Voltando para o tempo presente, a constante
expectativa da mulher ser boa em tudo é motivo de angústia e de
estresse, ao menos para ela. Pois, igual aos coleguinhas do sexo oposto,
as mulheres variam. São boas em algumas coisas e sofríveis em outras.
Da mesma maneira que os homens não querem e não
precisam ser super-heróis, nem maravilhosos pais, maridos,
profissionais. Nós, as mulheres, não precisamos e nem queremos a
infernal obrigação de ser boas em tudo."
Fonte
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